Slogan para campanha eleitoral: ame-o ou deixe-o

• Muita gente perguntando, a esta altura, como criar um slogan para a campanha. Eu preferia tratar disso quando chegasse no capítulo “comunicação” dos nossos posts como organizar uma campanha eleitoral, pois a tarefa é mais complexa do que simplesmente inventar uma frase de efeito. Mas como a pressão tá grande e eu entendo a urgência de vocês, vamos lá:

• Mais importante que o slogan, ou melhor, antes de chegar ao slogan, primeiro você precisa conceituar a sua campanha. Definir a sua mensagem. Definir o tema da sua campanha. Saber qual é a visão estratégica que você vai comunicar. E para isso é preciso descobrir o que diferencia a sua candidatura das demais. Comece pelos seus atributos.

• Primeira pergunta a fazer é: por que as pessoas votariam em você? É pela sua popularidade, é pelo seu trabalho, é pela sua proposta, é por que você é o único representante do seu bairro, é por causa do seu nome (tradição, família), é por conta das suas atitudes, da sua participação na comunidade, da sua história ou é por que os que estão aí no poder decepcionaram e os eleitores estão procurando alguém novo? O que de melhor você tem a oferecer? Sua idade, sua formação, seus apoios, suas idéias?

• Procure confrontar a sua candidatura com a do seu principal adversário. Exemplo: se você está concorrendo com um candidato mais jovem, pode se diferenciar dele por ter mais experiência. Por outro lado se você for jovem não deve usar, a princípio, o conceito da experiência, pois cria um contraditório desnecessário. Se você é o candidato da oposição pode se diferenciar por ser capaz de promover mudanças na sua cidade. Ou fazer melhor do que o candidato que está no poder. Se você é a situação, obviamente não vai tentar propor a mudança (embora alguns já tenham feito isso e era gente grande, que perdeu, claro).

• Pegue um papel e faça uma lista de suas fortalezas e fraquezas. Aproveite e liste também as do seu adversário. Seja honesto: você realmente é melhor preparado que ele? Se concluir que não, tudo bem, abandone essa comparação. Mas de outro lado, você pode chegar à conclusão de que a sua candidatura significa uma renovação política para o seu município. Então siga por esse caminho e já chegaremos lá.

• Além de atributos pessoais, a sua candidatura pode representar um assunto. Se você é professor, o da educação, se você é médico, o da saúde, e assim por diante. Mesmo que você não seja um profissional de uma determinada área pode, por algum motivo, estar mais ligado a um grupo, a um bairro, a uma questão específica. Aproveite esse diferencial e siga por esse caminho, pois chegaremos todos lá.

• Definimos até aqui que o conceito da sua campanha é o que o diferencia dos demais. Que ele é feito a partir do seu posicionamento. E não falamos, mas sabemos, que os seus atributos não existem sozinhos, mas sim em contraste com a realidade atual ou com os atributos de outros candidatos. Isso também é igual a diferenciação (frase esquisita essa, é quase um slogan absurdo: “igual a diferenciação”, mas é essa mesma a explicação, continuamos indo em frente).

• O fundamental é você descobrir a mensagem da sua campanha, uma mensagem que só pode ser sua, que não cabe em nenhuma outra candidatura e nem em outra eleição e acreditar nela. O estrategista americano James Carville definiu certa vez a mensagem como o prato de resistência de uma refeição. Se você decidir servir carne, você pode mudar o acompanhamento, acrescentar o molho, trocar a forma de preparo. Mas vai ser sempre carne, isso você não deve substituir durante toda a campanha. Esta é a sua mensagem. Já as batatas, o arroz, a mostarda, as verduras, a pimenta, você pode ir mudando, acrescentando conforme o público e o momento pra evitar a monotonia.

• Vamos exemplificar isso fora do cardápio gastronômico, pra facilitar. E já que citei Carville, vou continuar com ele. O ano é 1992, primeira campanha do presidente americano Bill Clinton. Candidato de oposição, seu time adotou como tema o “It’s time to change America” , numa tradução livre “Chegou a hora de mudar a América”. A mensagem traduz a vontade de mudança do eleitorado, tanto pela performance do candidato à reeleição, o presidente Bush (pai), na política externa com a Guerra do Golfo, como com a agenda da recessão que vive o país. Lembre-se também da promessa feita por Bush na eleição anterior, de não aumentar as taxas (impostos), tendo feito o contrário ao assumir o governo – o sound bite mais famoso dos anos 80, o “Read my lips: no new taxes”. Assim é que “It’s time to change America” serve como uma luva para a mensagem de uma campanha de oposição nos Estados Unidos em 1992.

• Mas para melhor definir a estratégia, certo dia numa reunião com a sua equipe, Carville escreveu três frases em um quadro: mudança X mais do mesmo; é a economia, estúpido; e não esqueça da health care (os planos de saúde, a previdência americana). Pois foi essa a frase do meio, “It’s the economy, stupid”, que sintetizou perfeitamente, em poucas palavras, o porquê da troca de comando no país. O problema era a recessão. E Clinton viria para resolver a questão que mais preocupava aos americanos, a economia, estúpido! Como diz a origem gálica do termo slogan, “It’s the economy, stupid”, tornou-se o grito de guerra da campanha.

• No entanto você não deve ter visto comerciais de TV ou cartazes com este slogan. Porque as frases que constavam destes materiais eram: “Putting people first” ou “For People, for Change”. Tradução livre: “Gente em primeiro lugar” (muito copiado a partir dali) e “Pelas pessoas, pela mudança”.

• Então para melhor situar a nossa conversa, o que chamamos aqui de slogan e que é o que o pessoal de marketing das campanhas municipais tem procurado aqui nos últimos dias para colocar nos santinhos dos seus candidatos é isso, uma frase como “Gente em primeiro lugar” e não algo como “É a economia, estúpido!” . Uma frase de quatro a sete palavras, sem contar os artigos, redigida de forma ritmada ou até rimada, com graça, intligência, que sintetize as vantagens do produto. Certo? Errado! Falei produto? Essa talvez seja a confusão. Um candidato não é como um produto, que tem uma frase única de venda tipo “Coca-cola é isso aí”. Um candidato tem uma mensagem que pode até ser transformada em um ou mais slogans ao longo da campanha. Não estou dizendo aqui para você não ter slogan, só estou lembrando que o conceito vem antes e é mais importante e que nem sempre o que chamamos de slogan é o que vai “pegar”.

• Vou dar dois exemplos bem próximos pra gente entender. Campanha de 2002, “Agora é Lula”. Essa era a frase da propagandas do candidato, que estava no jingle, em todas as peças. E que traduzia perfeitamente o momento do país, preparado para eleger aquele sindicalista que havia sido candidato derrotado à presidência duas outras vezes. Mas qual foi a outra frase, que ficou conhecida como o slogan de Lula em 2002, você lembra? Claro, era a mensagem contida na frase “Lulinha, paz e amor”. Esse foi o tema da campanha, o que deu o tom, o que permitiu o “Agora é Lula”. E depois, na reeleição? “É Lula de novo, com a força do povo” era a assinatura oficial, mas a frase que pegou primeiro foi a mensagem “Pai dos pobres” e depois a que realmente funcionou foi: “Deixa o homem trabalhar”. Frase esta que alguns candidatos estão repetindo agora nas eleições municipais de 2008, inclusive.

• Resumindo: não adianta você arrumar uma frase curta com rima, como na época em que a comunicação era toda no rádio, se você não acertar a sua mensagem. Perca um pouco mais de tempo com a mensagem e a frase, o slogan, virá naturalmente. O único cuidado que eu diria para você tomar na hora de escrever o tal slogan é evitar algo que possa um dia se voltar contra você. Isso pode acontecer ou porque a frase não se adequa totalmente ao perfil do candidato e por isso é questionada ao longo da campanha ou porque tem alguma palavra que pode ser invertida ou retirada ou modificada e assim ridicularizada. Leia em voz alta, consulte outras pessoas da equipe, fique paranóico mesmo, pois pior que a falta de um bom slogan é a existência de um slogan ridicularizado.

• Outra coisa: contra a maré dos meus colegas que gostam de testar slogan em grupo de pesquisa qualitativa, eu até às vezes testo, mas prefiro inverter o processo e antes procurar o conceito nas falas dos participantes do grupo. Muitas vezes alguém resume bem o que a gente quer dizer, naturalmente, sabe assim? Tipo “é a economia, estúpido”. Já a forma de colocar numa frase curta e bonita uma mensagem, cabe aos profissionais da publicidade, quando eles já receberam o briefing do conceito. Coitado do eleitor, ter até a responsabilidade de escolher slogan, acho meio demais, né, gente? Por falar nisso, tem muito slogan que é briefing. Tome mais esse cuidado: na procura de uma boa frase muitas vezes você explica o quer dizer. Em vez de dizer.

• Boa sorte e bom trabalho a todos!